Sermões de Santo Antônio: obra magna do Doutor Evangélico.

Por: Vitor Noronha

Santo Antônio de Pádua (ou de Lisboa, na tradição portuguesa) é popularmente conhecido por ter sido um grande pregador. E, de fato, o era. As fontes biográficas testemunham as numerosas multidões que a pregação do santo atraía. Não obstante, o livro “Sermões”, que por muitos é considerado a sua obra magna, não é o compilado das homilias e pregações que proferia oralmente em Pádua ou em tantos outros lugares onde passou. Seu objetivo é, ao mesmo tempo, escolar e pastoral.

Este livro de grande envergadura, que na edição brasileira conta com 1.090 páginas, é “sermão” somente no sentido do gênero literário, isto é, enquanto método utilizado pelo autor para transmitir o ensinamento. Aliás, o próprio Santo Antônio não chamava o livro de “sermões”, como conhecemos hoje, mas de opus, isto é, “obra”. Então, o que se trata a presente obra?

São lições para a instrução dos frades menores, preparadas por Santo Antônio no exercício da função de professor de noviços – lugar que foi conferido a ele por primeiro na história do movimento franciscano. Portanto, havia uma dupla intencionalidade: o ensino dispensado aos frades e a fundamentação da pregação a ser feita aos fiéis – uma preocupação escolar e outra pastoral. Sinteticamente, é uma obra de matérias sagradas, expostas em chave homilética.

Trata-se de uma obra rica em erudição, pela ampla utilização das Sagradas Escrituras (mais de 6 mil citações), pela alusão constante aos padres da Igreja, pelo diálogo com os teólogos e filósofos da época, pela utilização de literatos e poetas pagãos, isso sem contar a presença constante de peritos em ciências naturais, especialmente Aristóteles e Solino. Portanto, Antônio dialogava com o que havia de mais avançado na ciência, na filosofia e na arte da época, mas colocava tudo isso dentro da primazia da ciência sagrada. Apesar da extensão intelectual, não tinha um estilo especulativo, mas prático. No seu texto estão presentes imagens, figuras, muitas delas propostas pela própria Sagrada Escritura, muitas outras pela experiência ou outras fontes.

Os “Sermões” também são fonte importante de crítica social à luz do Evangelho. Santo Antônio neles condena a avareza, a usura, a inveja, o egoísmo e a falta de ética na administração pública. Também se volta contra muitos cristãos da época que eram falsos moralistas e hipócritas. Não se omite perante pecados do clero, denunciando muitos eclesiásticos como maus pastores de almas e aproveitadores que viviam no luxo. Criticava o orgulho dos eruditos. Especialmente, atacava os ricos ensimesmados que em sua sede de riquezas e poder oprimiam e excluíam os pobres do tecido social. Infelizmente, sua crítica social ainda é muito atual.

Enfim, a obra “Sermões”, ainda hoje, é fonte de inesgotável espiritualidade e instrução cristã. Já há mais de oito séculos Santo Antônio ordenava seu pensamento de modo cristocêntrico e fundamentado na Sagrada Escritura; e, ao mesmo tempo, é um texto envolvente, eloquente, persuasivo e corajoso: reprime o rico, defende o pobre e combate as heresias da época. Não por acaso, popularmente Santo Antônio era chamado de “Martelo dos Hereges” (Perpetuus Haereticorum Malleus). Continua, por vezes como que em marteladas, abrindo nossa cabeça para compreendermos e praticarmos o Evangelho, ao qual ele foi servo, pregador e doutor.

Compartilhar

Instagram